zero um três

"Vamos matá-los a todos."

Brusco, e directo ao assunto, como habitual. Estas foram as palavras de Brunn assim que Itgard se aproximou o suficiente para as escutar num tom ligeiramente acima dum sussurro. Ausente de ameaça, vazio, mecânico, determinado. O único traço de emoção residia nos olhos do Caçador. Uma faísca incandescente, indicadora dum intelecto táctico a funcionar em pleno. Os bárbaros das estepes podiam ser rudes, retrógados nas suas formas de estar, como se organizavam.

Enquanto que os povos ditos civilizados das cidades Além-Montanhas-de-Oeste viviam em governos organizados, com um Imperador no topo da hierarquia e uma série de governantes intermédios, cada acampamento bárbaro tinha o seu Ancião, que não respondia perante nenhuma autoridade a não ser a sua consciência. Enquanto que os povos civilizados se dividiam e se especializavam nas suas profissões, comerciantes, magistrados, militares, os bárbaros tinham de saber fazer de tudo. Saber caçar. Saber lutar. Sobreviver na estepe exigia tudo de um bárbaro, e às vezes algo mais. Os povos civilizados tomavam aquilo que lhes era dado. Os bárbaros tomavam aquilo que lhes agradava. Os povos civilizados defendiam o que era seu com regras e protocolos. Os bárbaros defendiam com dentes e com ossos e com madeira e se fossem realmente privilegiados, com o aço frio de lâminas roubadas. E era hora de defender o seu espólio.

"Estás a falar de quantos?" respondeu Itgard, meio sorridente por antecipar derramamento de sangue. Os outros aproximaram-se relaxados, sabendo que a única hipótese dos seus prisioneiros sobreviverem aos pântanos era ficando com eles.

Brunn explicou. "Batedores duma Vanguarda. Quatro a cavalo, com quatro cães. Somos mais. Eles têm armaduras e espadas. Não sabem onde estamos. Ainda. Apanharam o nosso trilho. Serão horas, no máximo dois dias, até nos encontrarem. Se corrermos."

"Então achas-nos mesmo capazes de os enfrentar? Somos apenas cinco com experiência, e o Rolf." O rapaz apoia-se no outro pé, esfrega as mãos, tenso, perante a menção do seu nome.

"O rapaz toma conta dos presos. Nós tomamos conta da Guarda de Jade. Não fugimos. Ficamos e lutamos. E morremos. Se não hoje, um dia."

Apesar de cada bárbaro ser um homem livre, era sensato seguir com o plano de alguém vocacionado para o combate deste tenra idade. Alguém treinado por Ghunn, o Ancião. Não houveram protestos. Apenas um sorriso, agora completo, no meio duma face temível, envolvida em cabelos e barba vermelhos. "Sim. Vamos matá-los a todos."

No início do pântano, junto a uma árvore mais antiga que as outras, mais antiga que as pedras e os bancos de areia, junto a uma enorme rocha cúbica de arestas afiadas, cinco figuras separavam-se dum grupo maior então chefiado por uma figura mais pequena. O grupo afastava-se, até que um dos bárbaros fez sinal e o grupo estacou. Uma mulher de cabelos vermelhos e alma ausente separa-se também deles e veio-se juntar aos outros cinco.

"Refém? Trunfo?" pergunta Itgard?

"Dispensável. Isco." responde Brunn.

"Mas é a minha preferida." suspira Itgard.

O sorriso regressa-lhe em menos dum segundo.

012