Hipocondríaco

Tudo à minha volta, escuro.
Uma forma negra, que me rodeia, qual serpente.
Sinto-lhe as escamas tocarem-me os lábios.

Um terror palpável, frio.

Estou deitado e prisioneiro,
Caminhando centímetros ao lado da loucura.
Fecho os olhos...
O sangue insiste correr rumo à paralisia.
Como se a vida fosse escassa.
O pequeno trovão no céu,
Seco e estrondoso,
Esquecido...
Após a chegada de um novo relâmpago.

Tenho um sabor estranho na boca,
Lembra sangue.
Não é...
Não é.
Não é!

As órbitas, sinto-as doridas,
Facto que se deve talvez
À insistente e perpétua procura
De meus olhos por um local seguro.

Um terror cortante, gelado.

Mais negro, uma forma negra,
De olhos escuros e dentes afiados.
Negros... Mais negros.
Tusso e tremo,
Combalido
Imóvel e gelado.
Tento fugir e ouço-a chamar.

A serpente sibila agudo,
Sinto escorrer nos ouvidos.
Lembra sangue.
Não é...
Não é.
Não é!

Não! Assim é, todos os dias,
Todas as horas de dormir.
Espero a invasão chegar,
Meu peito o chão que abala
Por debaixo desta marcha impiedosa,
O destino é por dentro.
De mim.
São melancólicos os cantos,
Quase diria,
Dotados de compaixão.
Não tenho direito ao dó?

Adormeço.

Som de asas de anjos.
Velam o meu sono?
Cheiro de velas que ardem.
Ardem por quem?
Um calor que conforta.
O local, é seguro?

O metal chia agudo,
Ouço o ar rasgar
Agora carne...
Lembra sangue.
Não é?
Não... é?
Não. É.

Acordo e não recordo
As horas em que estive de olhos agitados
Punhos cerrados.
O verdadeiro pesadelo
Recomeça.

É o raiar da primeira luz,
Banha a minha face pálida
E magoa meus olhos encovados.
Já nada é negro.
Já não sinto o inimigo
Que dorme comigo.
Onde?
Onde está?

Ah como desejo a noite,
Pois sei que lá, ele não se esconde
Na sombra
Ataca.
Não espera que eu caia.
Na sombra
Domina-me
E isso consola-me.